quinta-feira, setembro 17, 2009

Alice


Alice estava sentada na calçada, em frente a sua casa, como era tão habituada a fazer.
Chovia muito, mas Alice parecia não perceber. Talvez porque confundia suas lágrimas com aquela água do céu que não parava de cair.
Indagou-se se o céu chorava com ela. Mas não conseguia ter certezas nem respostas.

Alice nunca gostou de guarda chuva. Sempre lhe agradou o molhado que a chuva deixa na curvinha do pescoço. Quando pequena preferia sua capa de joaninhas a segurar aquele apetrecho tão estranho e grandalhão.
E hoje, especialmente, Alice queria sentir a chuva, pra ver se ela levava embora a dor que estava sentindo.

No fundo, Alice sabia que nem um dilúvio nem ninguém poderia lhe arrancar aquela angústia. E tinha medo que acabassem levando embora grudado, por engano, as lembranças que ela não queria ver partir.

Alice sentia-se imensamente sozinha. Mas preferia assim. Não conseguiria dividir seu vazio com ninguém, tampouco queria tentar esquecê-lo. Não agora.

Alice perguntou-se o que iria acontecer. Perguntou-se o que faria. Perguntou-se por que. Por que. Por- que. Porque....

Alice deitou a cabeça nas pernas e ficou assim por alguns instantes, que pareciam uma eternidade. Sentiu um carinho no seu ombro esquerdo e levantou os olhos. Uma borboleta amarela pousava pacificamente nela. Alice não tentou entender o que ela fazia ali, debaixo daquela tempestade. Apenas lhe deu abrigo próximo ao seu ventre para passarem o resto da madrugada juntas, imóveis e em silêncio.